“Heart and Soul”, homenagem ao Nicolau Samahá.


Mesmo mais de trinta anos após sua morte, sempre ouvimos falar de que “Elvis não morreu”. Contudo, Elvis é ainda “o morto que mais vende discos em todo mundo” até hoje. O branco que tinha voz de negro. Elvis deixou este plano no dia 16 de agosto de 1977.
Quando criança, todo dia eu subia à Praça da Igreja Velha pra levar almoço pro meu irmão Roberto Dias que trabalhava no Foto JK. Subia distraído e ficava encantado com os brinquedos dependurados nas portas das muitas lojas que supriam o caminho que levava até à praça. Mas era uma loja em especial que me fazia chegar atrasado ao meu destino: a Loja do Nicolau Samahá. O dia inteiro o ele ficava tocando na vitrola as músicas inesquecíveis do Elvis Presley que me deixavam encantado. Fora isso, as paredes de sua loja eram forradas com pôsteres gigantes do Rei do Rock por todos os cantos. Ele também se fazia parecer muito com o ídolo: Alto, cabelos com topete e costeletas enormes. Camisas chamativas e de golas altas. Parecia o próprio Rei do Rock mesmo. Elvis Presley teve um irmão gêmeo que faleceu dias após o nascimento. Pouca gente sabe que meu amigo Nicolau também era gêmeo do saudoso Zé Samahá. O Nicolau delirava contando isso. Ao longo do tempo, tudo isso acabou virando sua marca registrada. Era impossível não associar o ídolo ao seu fã número um. Nicolau esteve ainda na mansão do Rei do Rock em Memphis nos Estados Unidos. Viagem feita num avião fretado especialmente com vários fãs do Rei do Rock de várias partes do Brasil. Possuía tudo que lembrava o ídolo, toda espécie de “souvenir”. Visitou e fotografou ainda o túmulo onde o Rei do Rock foi sepultado. Fotografias tidas como relíquias.
Deixei de ser criança e não carreguei mais marmita até a praça. Mas uma vez ou outra gostava de passar em frente a loja só pra rever os retratos gigantes do Elvis e ouvir uma canção. Muito tempo depois, em meados de 98, quando trabalhava no Bar do Chopp, acabei ficando amigo do Nicolau Samahá. Sua casa fica bem em frente ao lugar onde ficava o bar, ali na Rua Oliveira Braga. Antes de abrir o bar, durante a faxina de lavar copos e passar um pano no chão, colocava sempre, entre as mais variadas músicas, uma fita k7 do Elvis pra tocar enquanto terminava a limpeza. Não dava cinco minutos e o Nicolau saía na sacada do seu prédio e ficava dublando e imitando o Elvis lá de cima. Era sensacional.
Foi no início de uma noite que o Nicolau Samahá chegou de repente e me perguntou:
-Você gosta do Elvis garoto? Sempre eu ouço tocar aqui. Quantos anos você tem?
-Eu tenho25. Mas música boa não precisa ter idade pra gostar.
Ele ficaria ainda mais meu amigo quando eu tirei da carteira minha identidade e lhe mostrei dizendo:
-Vinte e cinco anos feitos no dia 08 de janeiro. Olha só...
Ele olhou espantado pro meu RG e disse com um ar de surpresa:
-Não acredito! 08 de janeiro? Você faz aniversário junto com o Elvis?
-Faço sim. Só que ele é de 1935 e eu sou de 73.
-Impressionante! Você sabe tudo do Elvis garoto!
A partir deste dia ele virou meu fã e começou a levar sempre pra tocar no bar um Cd “inédito” do Elvis. Tomava no máximo dois chopps e comia uma porção de batata frita inteira, viajando ao som do eterno Rei do Rock.
Depois de ficar um bom tempo com a saúde frágil, meu amigo Lau, no dia 08 de junho, foi se encontrar com seu eterno ídolo num plano superior. Um plano “além luzes”.
Numa das suas últimas noites quando esteve internado na Santa Casa de Aparecida, depois de gravar uma canção inesquecível do Elvis no meu celular, fui até seu leito para que ele escutasse. Mas ele estava dormindo e eu não quis acordá-lo. Foi uma pena.
Além de assumir um lugar especial em nossos momentos as canções do Rei do Rock me proporcionaram a aproximação de uma grande pessoa com um enorme coração e que eu já conhecia desde criança. Assim nasceu uma grande amizade.
E como dizia a canção que naquela noite ele não pôde ouvir, meu amigo Nicolau foi sempre “Heart and soul”. Coração e alma até seus últimos instantes.
Disso eu tenho plena certeza.

Comentários

rednose79 disse…
Te achei nao sei como mas me veio as lagrimas a saudade do meu saudoso tio que me mostrou alem de ELVIS a autentica musica negra americana,saudade do tio Lau

Postagens mais visitadas deste blog

O chifre

Os 90 anos do Cemitério Santa Rita em Aparecida

Americanização