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Mostrando postagens de janeiro, 2015

Casa aberta e a Epopéia dos 70 anos

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Foi bem de manhã, com o sol já escancarado em luz que eu entrei na casa. Janelas e portas abertas pra vida como sempre. Rua do Pinhão. Passagem sagrada de vivos e de desencarnados. Fui recebido com honras por Dona Cida Freitas. Sorridente, iluminada como tudo ao redor. A primeira coisa que ela me perguntou foi de Larissa: -E a princesinha, como vai? Mostrei fotos e vídeos no celular. Choque de encantamentos entre as duas. Lembramos ainda os ausentes, Dona Nanêga, Seu Zé Affonso, Professora Glória. Mais recentemente Dona Besa. Até mesmo falar da morte por lá tem um teor diferente. É a "contenteza do triste e a tristezura do contente " redefinindo aquela saudade. Com pressa pra não perder o ônibus, prometi voltar e trazer a Larissa comigo. Antes de debandar para o cotidiano, Dona Cida me lembrou que este ano, em setembro, mais precisamente no dia 21, dia da árvore, Efigênia fará 70 anos. Eu disse que já sabia e que acontecimentos épicos deste quilate têm qu

“Tous sont Charlie”

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                                                                     (Todos são Charlie) O encontro foi minuciosamente planejado dias depois que foram esgotados os 5 milhões de exemplares da primeira edição do jornal marcado pela tragédia. O cenário escolhido foi uma antiga mesquita em ruínas. Pra eles, Maomé havia de guiar as esferas da negociata. Quatro deles fortemente armados guardavam a entrada do templo. Logo, um Renault preto metálico chega bruscamente àquele destino. De dentro do veículo surge um senhor forte e carrancudo, de terno preto, traços ocidentais, carregando duas malas. Não houve cumprimento nenhum das partes. Lá dentro o líder estava ajoelhado. Como de costume, voltava-se para Meca, absorto a tudo em volta. Mas outros dois deles observavam atentos. Ele se levantou batendo a poeira das vestes e se dirigiu ao homem de preto perguntando com um francês pobre e ralo: “Vous avez apporté a combine?”. Numa livre tradução : “O senhor trouxe o combinado?”

"Je suis Jean Charles"

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Prestes a completar 10 anos, o assassinato do brasileiro Jean Charles no metrô de Londres cometido pela SO19, a unidade armada da Scotland Yard, caiu no esquecimento. No Brasil, foi notória a adesão ao  “Je suis Charlie” pelas redes sociais. Isso ocorreu graças a comoção que a mídia internacional impôs goela abaixo sobre os atentados terroristas ocorridos na sede do jornal Francês Charlie Hebdo. O assassinato dos membros do jornal Charlie vai ser ainda por um bom tempo o grande acontecimento pelo avesso da nossa geração. Mas de inocentes eles não tinham nada e o restante da equipe anunciou dias depois da tragédia a remessa de 3 milhões de exemplares para o próximo número do jornal, que esgotados, subiu para 5 milhões.  A edição veio novamente estampada com outra charge do profeta Maomé. Um humor ácido de um ato irrelevante diante de um lucro estimado em 15 milhões de Euros.   A liberdade de expressão diante disso acaba exalando um teor irresponsável sim e se confunde com uma

Mambembe

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Havia um plano. Tínhamos ensaiado cenas, um repertório. Conforme os dias iam passando, éramos contaminados pela criatividade: havia dança, música, poesia. Lembrava o cinema. Entrelaçavam emoções e memórias. As pessoas iam e vinham curiosas. Houve gente sentada lá no canto da praça espiando desconfiada. As figuras típicas da praça também estavam lá: o cachorro, o bêbado, o pipoqueiro. Uma atmosfera diferente estava sendo incorporada... Mas afinal, qual seria a história a ser interpretada? A de um homem maltrapilho e sujo encantado num cenário ambulante cheio de cacarecos dependurados. Era um texto enxuto que não só flertava como namorava o politicamente incorreto. Mas o tema principal da trama era o risco dirigido pela coragem. Principalmente os riscos impensados que emergem por causa do sopro artístico. Do lado de dentro, mais do que levar arte, a busca era encontrar novos adeptos da revolta. Disseminar possíveis encantamentos pela causa. De escutas, de pensamentos, de

Os 80 anos do último Retratista Lambe-lambe

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Quase toda manhã eu o encontro subindo a Rua Floriano Peixoto. Andar vagaroso, “ manquitolando ” de uma perna. De boa prosa e memória aguçada. Nossa conversa não foge á regra: a arte fotográfica. Da lembrança, trazemos à tona a memória dos retratistas falecidos e suas histórias, apelidos e artimanhas. Foi com ele que aprendi que a fotografia não pode ser considerada apenas um arquivo. Quando fotografamos com os olhos, retratamos a alma. Assim as recordações não se deterioram na poeira do tempo e da saudade. O meu amigo retratista corinthiano Antonio Minaier foi um dos pilares na concepção do livro “ Os Guardiões da Santa ” que narra a saga dos Retratistas Lambe-lambe da Praça Nossa Senhora Aparecida, lançado ano passado. Graças a ele, retratos postais em preto e branco e sépia de formato original 9x12, guardados num baú de recordações, puderam ilustrar com fidelidade as páginas do meu livro. Ao longo do tempo ele ilustrou também inúmeros jornais e revistas mundo afora, to