Conto que conseguiu a 3ª Colocação do XXII Concurso de Contos da Biblioteca Municipal de Aparecida-Ano 2011



“PAPARAZZO”

...A pacata cidade, até então, ficou por alguns dias envolvida num tremendo contingente de pessoas. Autoridades civis, militares e religiosas eram os que mais se encontravam pelas ruas agora iluminadas. Cardeais, bispos, padres, frades e freiras de diversas partes do Brasil e de toda América Latina. Números ultrapassados somente por câmeras e celulares com função fotográfica.
Eram esperadas ainda mais de 500 mil pessoas, pois afinal, além de ser dia das mães, estava em visita na cidade o Papa Bento XVI, sucessor de São Pedro, expoente máximo da Igreja Católica no mundo. Expectativa destruída com a realidade amanhecida daquele domingo importante.
Em meio a “tanta” gente, estava de passagem pela cidade, vindo do Rio de Janeiro, um jovem de classe média alta, portando uma máquina digital de última geração em busca de uma imagem histórica do Papa. Um carioca “esperto”, cheio de “marra” como quase todos os demais.
A grande oportunidade para realizar este feito seria no sábado pela manhã, bem na hora em que a comitiva de Bento XVI sairia do “Colegião” com destino a fazenda Esperança, no Bairro das Pedrinhas, em Guaratinguetá.
Tinha de ser naquele instante, pois, depois do almoço, seu compromisso profissional o obrigaria a seguir para São Paulo. Não haveria outra chance como aquela.
Logo pela manhã, já estava nas imediações do Colegião, aguardando a saída do Papa marcada para as nove e meia.
Assim que os recrutas do exército começaram a armar o gradil limitando o acesso do povo e da imprensa, escolheu estrategicamente um ângulo privilegiado, bem em frente ao portão principal e ficou ali. Não tinha como errar.
As horas foram passando e logo mais e mais pessoas começaram a chegar, fazendo com que o aglomerado aumentasse. Nosso “paparazzo” então já não se encontrava tão confortável em seus movimentos. O empurra-empurra tomou conta do espaço em questão de minutos.
Nas janelas e sacadas ao redor, emissoras televisivas disputavam as melhores posições. A expectativa era grande como o momento e envolvia até o mais desatento dos ateus. Não poderia ser diferente.
Enquanto alguns “puxavam” as rezas do terço envolvidos pela emoção, outros ficavam em silêncio, quase nem acreditando na possibilidade de ver o Papa passar.
No meio da confusão já formada, sem querer, um romeiro de roupas e jeito bem simples, tendo em mãos uma máquina fotográfica descartável de R$1, 99, acabou esbarrando com mais desajeito no jovem turista. O que se ouviu foi uma sonora “bronca” que deixou o homem simples com vergonha da situação.
Apossado de toda humildade, pediu desculpas incisivamente. Como resposta teve outra bronca e depois um cortante desprezo do “almofadinha”.
O cântico dedicado ao Papa tomou dimensão nas vozes quando o portão se abriu liberando as motos “Amazonas” da diligência papal. Foi uma intensa gritaria. Mãos, celulares e câmeras ao alto, pessoas nas pontas dos pés. Todos queriam ver o “homem” passar. Registrar aquele eterno momento.
A decepção se fez maior ainda que toda a expectativa criada em torno daquele instante quando uma Mercedes preta, com os vidros todos eles escuros, saiu em toda velocidade deixando o jovem “paparazzo” e todos que ali aguardavam com cara de bobo.
Na dispersão das pessoas, entre “murmurinhos” e bandeirinhas, eis que o romeiro se dirigiu ao jovem para pedir novamente desculpas. Um pouco mais educado o carioca falou:
-Tem nada não amigo, tudo bem. Só fiquei triste mesmo em não poder ter tirado uma foto do Papa saindo de “Papa-móvel”. Chance como esta nunca mais...
Com toda simplicidade do mundo, o romeiro que era de Minas Gerais, tentou consolá-lo dizendo:
-Num fica tristi não cumpanhêro. O Papa só vai imbora amanhã di noiti. Tem tempo ainda pro sinhor tirá um retrato bão dele. Onti, quando ele chegô, eu tirei um retrato di pertinho dele. Amanhã vô tirá mais. Si ocê quizé ti dô um retrato pra me discurpá co cê quando eu revelá o filme. A máquina num é lá essas coisa, mas acho eu qui vai ficá bão os retrato...
Mal sabia o “minêro” que isso seria impossível.
O jovem agradeceu e se despediu em silêncio com a cara de bobo ainda estampada no semblante. Não adiantou sua câmera digital importada de última geração nem sua “esperteza” carioca diante daquela situação imperdível.
Embarcou ás treze e trinta rumo a São Paulo numa plataforma da rodoviária com a inveja corroendo por dentro e pensando na sorte e no tempo que o romeiro teve e teria pra registrar aquele momento histórico que passou...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O chifre

Os 90 anos do Cemitério Santa Rita em Aparecida

Americanização