De volta à Paraty.


Cresci ouvindo meu pai dizer das viagens feitas para Paraty nas épocas de Festa do Divino. Ele e alguns retratistas de Aparecida todo ano desciam a serra pra poder faturar alguns Cruzeiros tirando rtratos das muitas pessoas que se dirigiam até lá. As viagens eram sempre muito cansativas. A estrada Cunha-Paraty era naquela época péssima. Não havia se quer um metro que não fosse estrada de chão. Quando chovia era muito pior. A estrada ficava quase intransitável. Mas os retratistas sempre superaram essa dificuldade e todo ano embarbcavam num pequeno caminhão alugado. Iam todos espremidos entre as antigas máquina tripé “lambe-lambe”.
Foi numa dessas viagenas à Paraty que certa vez o caminhão que carregava a turma de fotógrafos virou na descida da serra. Um acidente onde meu pai fraturou aperna. Daquela vez, só seguiram viagem os que nada sofrerram. Os outros foram resgatados e voltaram para Aparecida, inclusive meu pai, com sua perna quebrada, que doeu pra sempre. Ele nunca mais voltou à Paraty.
Em maio de 99 eu e meu primo Luizão resolvemos descer a serra. Eu nunca tinha ido à Paraty. Chegamos na manhã de uma segunda-feira e nos hospedamos na “Pousada da Canoa”. Com posse de uma máquina fotográfica que ainda usava filmes, fui então percorrer aquelas ruas históricas. O casario antigo de Paraty transmitia algo místico. Eu estava vislumbrado com aquela arquitetura rica. As igrejas exalavam um cheiro específico. Um azul inexplicável no céu emoldurava e dava um contraste nos telhados escuros pelo limo do tempo. As pedras tortuosas dificultavam o caminhar que solenemente ia de encontro com o passado. Ruas por onde o ouro de outrora iluminou a corte com seu brilho. À noite, perambulando pelos bares, nos embrenhamos no famoso “Café paraty” onde o saudoso amigo “Foguinho” tocava magistralmente um piano de calda. Na prateleira, muitas garrafas de variadas marcas da famosa pinga de Paraty: Melado Rival, Branca do Fundão, Colonial Azulada, Pinga Azulada, fabricada de forma artesanal desde de 1803, Pinga Coqueiro, Pinga Corisco que tem vários sabores, atradicional Pinga de Paraty, a Fim de Século, a Caninha Labareda, a Maré Alta, com seus rótulos cheios de gravuras e fotos dos sasarões antigos, A Paratyense, Pé de Briga, Praiana, Serrana e a conhecida Vamos Nessa. Uma me chamou a atenção, pois trazia em seu rótulo um pequeno texto que dizia “Na agoa ardente tem progresso e sobre tudo na feitura que lhe assegura de aumento sete mil Réis em pipa sobre as demais. Os chimicos talvez descubram, examinando o causal da melhoria, se do terreno, das agoas ou das lenhas provém”...
De volta à Aparecida disse ao meu pai que Paraty era por si só um verdaeiro encanto. Ele estava muito curioso em ver as fotos que eu havia tirado por lá. Dois dias depois, meu pai sofreu um infarto e faleceu. Não houve tempo de rever Paraty pelas fotografias que tirei. Nunca mais voltei à Paraty.
Hije, por essas páginas do “Correio Paratyense”, de certa forma, vou perambulando por entre o casario inesquecível de Paraty. E meu pai, preso na eternidade de sua luminescência, empresta um pouco do brilho de seus olhos azuis àquele azul inexplicável que com certeza continua emoldurando em contrastes os telhados escuros daqueles velhos casarões...

Jornal Correio Paratyense, outubro de 2008

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