O memorável “Bar Ca..."

Há lugares que não acrescentam em nada.
Há lugares mudos. Há lugares que nos mudam. Verdadeiros incômodos a cutucar aquilo que está lá, guardado.
De repente, uma explosão de saudades. Extensa. Poética.
Meu pai ia lá.
Cansado, geralmente sexta-feira, não contente talvez em lançar a semana toda seu flash de magnésio sobre sus própria história, fazia o favor de beber suas imprudências que se diluíam dentro de um mágico copo de cerveja. Um queijo, saleiro. Palito a cutucar o sorriso.
Rua Santa Rita. Anos 90. E ali fritavam o cotidiano regado a boas doses e múltiplas conversas.
Nos momentos daquela espécie de conto, era possível encontrar um mero 3x4 amarelado na memória que logo, em traços, tornava o anônimo passado em uma magnífica importância.
Era quando na semana, fixava-se no mural interminável de coisas o desenho ou o embate gramatical de pensamentos vomitados em palavras um pouco mais modernas que as mimeografadas.
E passaram a viver esse gosto.
Iam e voltavam pra casa, pro trabalho. E sempre encontravam o caminho dali.
O mural, que veio de outro ponto pra lá, já tinha tomado ares de sagrado/profano.
A verdadeira literatura é aquela que nos mostra o quanto estamos perdidos.
Perderam-se os papéis. Perdeu-se o mural. Até o dono do lugar perdeu-se na imensidão.
Perdeu-se meu pai que teceu na minha memória aquele ato heróico de sobreviver na profundidade do balcão do “Bar Ca”.
Perdeu-se um tempo. Mas engana-se quem pensa que a memória se perdeu...


Em memória do amigo José Maria
Falecido em 13 de abril de 2016




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