O "primo" Lindóia

Além de disputar romeiros durante o dia de trabalho, sempre que podiam, os retratistas se reuniam para disputar uma partida de futebol no lendário campo da santa, local onde se encontra hoje a Rádio e TV Aparecida.
A coisa ficava séria quando o time do Kodak E.C., formado pelos fotógrafos da praça, jogava contra o time formado pelos agenciadores e flanelinhas. A disputa era acirrada, digna de crônica e manchete na extinta Gazeta Esportiva da época.
Naquela tarde o time do Kodak ia para o jogo desfalcado de alguns considerados titulares. O saudoso retratista Bichêra era um deles. Ele optou por ir para a praça naquele dia pra ver se conseguia bater algumas chapas, visto que estava com o aluguel da sua casa atrasado e não poderia participar da peleja de logo mais.
Mas o movimento muito fraco na praça ia fazendo o Bichêra desistir da empreita...
Ele começou a juntar suas “tráias” quando de repente um romeiro o aborda:
-Companheiro, gostaria de tirar um retrato em frente a igreja pra deixar lá na sala dos milagres...
Um golpe de sorte naquele marasmo.
Preparando o freguês naquela pose imperdível foi que o Bichêra acabou reconhecendo o romeiro:
-Espera aí... Por acaso você não é o Lindóia que jogou na Portuguesa Santista?
-Sou eu mesmo. Encerrei a carreira, mas não pude deixar de vir aqui na paricida agradecer...
Lindóia foi um jogador mediano, sem muito sucesso no futebol. Perambulou pela Portuguesa Santista, Nacional da capital, Juventus até encerrar a carreira no Noroeste de Bauru.
Após batido o retrato, o Bichêra teve a grande ideia de convidar o ex jogador para bater uma bolinha no campo da santa. E ele aceitou, visto que iria ficar a semana toda na cidade.
A única recomendação do Bichêra era para que ele dissesse ser um primo que veio tentar a vida como retratista em Aparecida, se não, a contratação de última hora, ia pras cucuias.
Fazia algumas partidas que o time do Kodak não vencia. Quando chegaram ao campo, o time já perdia por um a zero. Logo saíram o Meio Kilo e o Currila para entrar o Bichêra e o seu “primo”.
Não é preciso dizer que o Lindóia acabou com o jogo, marcando três gols na virada do Kodak depois de um longo jejum.
Semanas depois, um moleque que lavava chapas e que sempre atuava como gandula nas partidas, veio todo baforido trazendo uma folha da Gazeta Esportiva:
-Seu Bichêra, Seu Bichêra, olha a foto do seu primo que jogou aquele dia... Saiu na Gazeta...
Com a promessa de uma gorjeta bem gorda no final de semana feita ao menino foi que o retratista Bichêra conseguiu sumir com aquela página de jornal antes que ela pudesse cair nas mãos de algum agenciador ou flanelinha da praça...


Postagens mais visitadas deste blog

Histórias de um sagrado manto

O chifre

As ruínas da nossa história (01)