Além luzes
Foi a saída do último carro por ele vigiado naquela rua que fez com que o barulho das moedas em seu pequeno bolso fluíssem com mais força. Ele já tinha em mente o que compraria com elas.
Não seria nenhum brinquedo. Mesmo porque, achava que estava “crescendo”. Todavia, este sentimento lhe tomava claramente, pois, era intimado pelo pai para ir à rua vigiar carros e ganhar algum trocado mísero. Isso parecia-lhe coisa de adulto.
Contrariando a fome familiar eminente, foi direto a uma dessas lojas recheadas de artigos de natal. Aquele clima enchia-lhe os olhos. Assim ele foi direto naquilo que mais ansiava comprar: Um colorido pisca-pisca.
Com certa consciência, dispensou a sacola plástica oferecida pelo balconista e foi pra casa.
No caminho, janelas esculpiam o belo embaladas pelo clima do Natal. Pessoas apressadas caminhavam cheias de pacotes. Ele segurava forte o seu, pensando na felicidade de sua mãe ao se deparar com aquelas luzes clareando o breu da casa. Isso lhe tomava por inteiro, pois não aguentava mais o cheiro de velas acesas espalhadas pelo chão da casa e pelas arruinadas e carunchadas mobílias que restavam por lá.
Chegou ofegante. E antes que seu pai, desempregado há anos, pudesse lhe cobrar pelos rendimentos do dia, ele entregou sua pequena caixa. Junto, ia um pequeno cartão que trazia a velha frase “Feliz Natal”.
O pai, levemente alcoolizado, mais pela desgraça da vida miserável do que pelas pingas brindadas no dia, não teve forças para lhe dar bronca.
A mãe travava com a torneira uma luta desigual. A água, que acontecia escassa, na bacia ia banhar o menino escurecido pelo tráfego poeirento do asfalto da rua.
Arrasado, o pai apenas tentava achar um jeito de explicar a falta de energia no lugar.
Iluminado pelas velas tentava enxergar a data de vencimento de uma nova conta de luz que havia chegado na tarde daquele dia e que ele, igual as outras dos meses anteriores, também não ia ter condição nenhuma de pagar...