O observador
O silêncio
do apartamento vazio denunciava uma fuga. Um bilhete
grudado entre os ímãs da geladeira relatava a frieza das palavras. Junto, uma
foto e uma pequena e estranha chave condicionavam mais desespero àquele
desterro:
“Ainda preciso que me dê provas de seu amor. Nessa minha última estadia em Paris, coloquei um cadeado com nossos nomes gravados nele. Ainda busco por você e não fui capaz de jogar a chave nas profundezas do Rio Sena. Se me ama mesmo como diz, busque, encontre e traga esse cadeado pra mim”...
“Ainda preciso que me dê provas de seu amor. Nessa minha última estadia em Paris, coloquei um cadeado com nossos nomes gravados nele. Ainda busco por você e não fui capaz de jogar a chave nas profundezas do Rio Sena. Se me ama mesmo como diz, busque, encontre e traga esse cadeado pra mim”...
A fotografia
deixada junto com o bilhete a mostrava na famosa Ponte d’Art, em Paris onde
casais do mundo todo prometem mutuamente amor eterno trancando um cadeado na
grade da ponte.
Ele entrou
em desespero. Passou horas e horas tentando entender onde poderia ter errado. Pelo
cansaço, acabou dormindo em meio a foto e o bilhete rasgados em vários pedaços.
No outro dia
bem cedo, a primeira memória em sua cabeça era aquela que tentava solucionar
aquela improvável e impossível situação. Como encontrar um cadeado trancado entre
milhares de outros cadeados em uma ponte em Paris?
Por sorte,
seu trabalho em uma agência de empreendimentos o levava quase sempre à Europa. Numa
dessas escalas internacionais ele teria que visitar alguns clientes na Espanha
e Alemanha. Era a devida deixa para esticar seus dias até Paris, e à beira do
Rio Sena, tentar a loucura de encontrar o bendito cadeado que pudesse provar
seu amor àquela que o deixou.
Ele tinha
como costume, antes de suas viagens mais demoradas, visitar seu velho pai que
vivia sozinho em uma casa a poucos metros de seu apartamento. Seu pai foi fotógrafo
ambulante, desses que viviam pelas praças públicas eternizando o cotidiano das
pessoas que iam e vinham.
Conversando com
seu pai na varanda da casa, contou-lhe sua agonia e o imbróglio do cadeado. A primeira
pergunta do velho retratista foi categórica:
-Meu filho, a fotografia da ponte, onde
está?
Por alguns
segundos ele ficou tentando lembrar onde tinha enfiado a foto. Lembrou que
tinha rasgado, assim como o bilhete.
A sentença
de seu pai o fez levantar num só pulo da cadeira:
-Então vai lá, revire o cesto do lixo e
traga parte por parte deste retrato pra mim...
E assim ele
o fez.
Alguns minutos
depois ele voltou com os pedaços da foto nas mãos. Na mesa da sala, o velho
colou minuciosamente, pedaço por pedaço, aquele quebra
cabeça cujo a solução valia um amor. O filho apenas observava.
Tudo remontado,
o pai veio até ele arrastando os chinelos de sua sabedoria:
-Observe meu filho. Quando você estiver em
Paris, observe bem a paisagem. Tente se enquadrar
neste ângulo da foto. Veja lá atrás os prédios, a bifurcação do rio. A Catedral... O cadeado
que você vai procurar não deve estar
longe deste poste de luz...
Um abraço e
um beijo terno na testa do velho fotógrafo vieram cheios de emoção e orgulho.
Na semana
seguinte sua amada não pensou em outra coisa se não voltar para o apartamento
deles.
Ela tinha recebido
pelo celular a foto de um cadeado onde estava gravado “Joaquim & Larissa, Pra Sempre”...