Eterno palhaço
Foi num tempo em que o circo ficava onde se traçou a Avenida Monumental.
Nas matinês, esperava sempre por duas atrações incríveis: o elefante fazendo acrobacias e os palhaços, que supriam o lugar debaixo da lona de risos.
O circo ia e voltava numa frequência ignorada para o menino que fui.
Bebendo dessa água, eis que com o tempo, um dos palhaços ficaria por definitivo na cidade. Dizia não ter mais bagagem pra acompanhar o circo. E por aqui foi ficando, ficando... deixou de ser palhaço.
Na fila do banco em Guaratinguetá, de longe conheci aquela figura. Meio despojado de luxo, humildemente passivo diante da fila de idosos formada em sua frente, pois era dia de pagamento de aposentadorias e benefícios. Bigode amarelado pela nicotina constante, barba por fazer. Olhos levemente vermelhos.
“Boa tarde, por acaso o senhor não era aquele palhaço que vinha sempre com o circo na cidade de Aparecida?”
“Meu filho, que memória. Sou eu mesmo. Você se lembra?” ... E passou a me contar de suas idas e vindas com o circo. Aquele ser mágico que tanto fez rir, através de suas lembranças, ficou mesmo é com os olhos rasos d’água. Pura saudade de tudo.
“Mas eu me aposentei como vigia há alguns anos”, completou.
Com a fila andando, deslocamo-nos um do outro com a pertinência de não tirar o foco da conversa.
Distraído com as aparições das senhas no monitor, fui surpreendido por ele que ao pé do ouvido me disse:
“Aposentei-me como vigia, mas com esse ordenado que o governo paga, me sinto novamente um palhaço. Todo mês é assim”...
O homem de cabelos brancos que fez a gente tanto rir, ignorava as lágrimas e tentava rir também daquela piada de mau gosto.
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