Velho Casarão.
...O céu foi escurecendo lentamente e guiando algumas nuvens escuras para um outro posto.
Mesmo temendo uma suposta chuva, fui caminhando.
No pensamento, lembranças agiam como fuga diante da fragmentada realidade.
Eu procurava um lugar. Qualquer lugar entre o céu e a terra que pudesse eternizar idéias que vão sempre além da noite e rasgam a madrugada. Pequeno universo capaz de nos remeter ao centro de nós mesmos.
Na Rua Anchieta, passei sem pressa pelas ruínas do velho Hotel Paraná, onde tijolos enormes agonizavam amontoados num canto de um tempo esquecido.
Pareceu que alguns sonhos ainda perambulavam por ali, libertando o imaginário. Mas era um lugar de nunca mais.
Logo ganhei a praça. É onde o contemporâneo tenta reorganizar o encontro e iluminar o histórico, alinhavando isso ao sublime.
Restos de algumas arquiteturas geram beleza ao meus olhos. Vejo o grupo escolar decolar rumo ao infinito guardando relíquias do lugar.
Tomando a Rua Barão do Rio Branco, percebi de longe um vazio. Foi quando outra ruína sinalizou um passado inesquecível.
Nas viagens do sentir e do pensar, quis destruir espectros de homens comuns.
Já não pude mais ver então o impoluto Casarão da Família Barreto que ostentou no alto de si o ano de sua aparição. Era mil novecentos e vinte e oito.
Pareceu que as ruínas conheciam dor. Espelho de mim que apenas passava.
Foi como se acordes adormecidos pelo tempo ganhassem vida outra vez...
Quantas vezes, por imponência dos seus filhos, o amplo casarão pôde reinventar a canção lendo outras partituras. Imaginária melodia que fluiu bela pela existência.
Lá no fundo, escapando das ruínas, pareci ouvir o som de um piano pelas mãos de Dona Conceição Barreto. Mãos cheias de ternura.
Segui resignado até dobrar a Rua Licurgo Santos...
O trem de prata trazia seus passageiros e anunciava também algumas partidas. Ele mesmo partiu antes do novo e mais rápido trem chegar. O trem de prata era mais doce que o trem bala.
Minha atenção, num outro porém, se deteve a um velho casarão que ostentava no alto a legenda “1896”...
Um casarão cor de ouro instalado laico ao lado de uma igreja vazia. Onde luzes reacenderam e iluminaram sonhos dormentes que hoje guardam relíquias de antes.
Casarão de vastos salões, quase imperiais, assim como deveria ser a vida.
De tons profundos e marcantes na aquarela da memória. Com quadros emoldurando os olhares e retendo a arte.
Casarão de uma existência que canta a beleza do espaço e faz o momento se embrenhar nos acordes do tempo. De desavizadas penumbras guiadas pelo candeeiro elétrico que já não carece mais de assopros para fazer brotar a escuridão que implica num silêncio.
Casarão de telhados altos, aproximando-se de Deus.
De portas trancadas por chaves vigiadas pelo personagem de uma história sem fim.
Pela janela azul, vi o tempo cavalgar pela noite.
Pareceu o vento...
A inspiração rebento entrou pela janela e quase encontrou meu instante desatento.
Lá embaixo, na estação, outro trem partia. Mas o coração não.
As linhas paralelas seguiram sem destino para não sei onde.
Mas o coração ficava.
Tentava ao menos esquecer as ruínas a as saudades do caminho...
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