Aquilo que não se vê
Da janela
vinha o barulho. Era o som do bloco que passava pela avenida em frente.
Cores,
brilhos, encenações de romances. Carnaval.
Ele não sabia
por onde andava aquela colombina.
Amaram-se
demais naquela única noite. Bêbados em êxtases e folia.
Parecia um
sonho. Ele estranhou o seu jeito baseado em fatos irreais. Por pura alegria foi
e também deu umas tragadas naquela fúria de liberdade. Começou a rir perdido
entre a fumaça.
Amavam-se. Amaram-se.
A cabeça
rodava ainda plena de lantejoulas brilhantes e coloridas.
Acordou sem mais
vê-la. Levantou-se depressa. Tomou um banho. Achou estranho aquela seringa no
cesto do banheiro.
Pagou uma merréca
pelo pernoite no hotelzinho barato.
Onde ela andaria? Não a viu mais. Nunca mais.
Um ano se
passou. Ele trancafiado no leito do hospital na área de isolamento. Tarja vermelha
na porta do quarto.
O soro
medicamentoso pingando lentamente pelo scalp, invadindo as veias.
Fraco. Devastado
pelo vírus.
O bloco passava.
Ele também.
Cinzas que a
família espalhou num jardim...